22 de jun. de 2012

RUI BARBOSA / A Tempestade e a Procelária



                      por Pedro Luso de Carvalho


        RUI BARBOSA nasceu na Bahia a 5 de novembro de 1849. Seu pai, João José Barbosa de Oliveira, médico e político liberal na província, exerceu grande influência na formação mental e espiritual  do filho. Nesse sentido, nenhuma outra pessoa viria superá-lo. Rui Barbosa mantinha sempre terna lembrança do pai, como declarou: “Era ele, na minha província, a maior cabeça da sua época, o orador mais perfeito que já conheci, distinguindo-se, ao mesmo tempo, como um caráter de limpidez e inflexibilidade adamantinas”.

        O Dr. João José Barbosa de Oliveira, que se encontrava angustiado pelas dívidas contraídas e pelo ostracismo político, faleceu  pouco depois da formatura do filho. O jovem Rui entregou-se, então, à advocacia e ao jornalismo. E, também, ao Partido Liberal.  Rui Barbosa viveu setenta e três anos, de 1849 a 1923. Sua vida foi um exemplo de luta e de honradez. 

        Homero Pires escreveu uma excelente obra sobre a paixão que Rui Barbosa tinha pelos livros; de cujo livro, transcrevo o capítulo intitulado A Tempestade e a Procelária (In PIRES, Homero. Rui Barbosa e os livros. 5ª ed. Rio de Janeiro: Edição da Casa de Rui Barbosa, 1951, p. 7-8), como segue:  


                                        [ESPAÇO PARA RUI BARBOSA]

                                     A TEMPESTADE E A PROCELÁRIA
                                                               (Homero Pires)


        Falar pois dos livros de Rui Barbosa, não dos que escreveu, mas dos que ajuntou no decurso de cinquenta anos, o mesmo é que falar dele próprio, da sua índole, do seu gênio, da sua formação mental. Penetrar-lhe na biblioteca equivale a penetrar-lhe no caráter e na inteligência, a investigar-lhe os elementos da cultura, a descobrir-lhe os recursos da erudição, a reconhecer-lhe as energias que lhe alimentaram e retemperaram o ânimo, a explorar-lhe as tendências e preocupações não reveladas da sua vasta curiosidade espiritual.

        Jurisconsulto, advogado, homem de estado, orador, jornalista, moralista, cultor infatigável  da língua, homem de letras enfim, na sua enorme biblioteca de trinta e cinco mil volumes estavam os vastos mananciais que lhe entretinham todas essas atividades e preocupações intelectuais. Os seus autores preferidos, as espécies e variedades dos seus livros nos ajudam a explicá-lo tanto como as suas próprias obras, as suas opiniões e a sua ação militante na vida pública. 

Os livros fizeram-no, como também fizeram a Santo Inácio de Loiola e a D. Quixote, figura esta com a qual, para o diminuir, certa vez o compararam, e ele sagazmente aceitou o paralelo. Fizeram-no, como o navio e o mar fazem o marinheiro e a tempestade a procelária. 

        A sua formação processou-se sobretudo pelos livros, servindo-lhe estes como de faróis, que lhe descobriam e iluminavam os caminhos que tinha por diante. À proporção das leituras, à proporção de cada contato com uma revelação bibliográfica notável, iam-lhe ficando no temperamento marcas e sulcos profundos, abriam-se-lhe ao entendimento orientações diversas e novas. Assim as influências se disputavam entre si a posse do seu espírito.

        Por que não haveria de vacilar e mudar? Tudo varia e se transforma de contínuo na face do mundo, que é um perpétuo 'devenir'. A um critério sucedia outro, e a si mesmo se interrogava, repetindo a eterna pergunta da eterna dúvida, e que é caminho da sabedoria: “Onde está a ciência”? Só os que não meditam e não estudam, só os que se petrificaram em vida, só esses permanecem imutáveis, iguais sempre em toda a carreira da vida, como a visão do deserto ermo, desolado, soturno e vazio. 'Il n'y a que les sots qui ne se contredisent'.


                                                                            *

REFERÊNCIA:
LACOMBE,  Américo Jacobina. Rui Barbosa. São Paulo:Livraria Martins Editora, 1965, p. 125.


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